Á descoberta da Graciosa


Raul Brandão chamou-lhe 'A Ilha Branca'. Como viajante digo que tem um verde diferente das outras oito que com ela formam o arquipélago dos Açores. É tenra, mansa, repousante e simultaneamente desafiante. Esconde segredos como a lenda da Maria Encantada e um vulcão florestado a meio do século passado que nos transporta para uma dimensão sulfurosa e mágica. Obrigatória para projetos de férias de natureza.


GRACIOSA Deve o nome aos colonizadores que assim a batizaram por ser bela e harmoniosa 
A nuvem da Graciosa é pequena. Os habitantes dizem que é a mais seca de todas as ilhas açorianas porque o relevo não abunda. A água doce passa-lhe por cima mas vai cair noutras paragens emprestando um tom esmorecido e "tenro"ao verde da paisagem. As imagens do "verde tenro" e da "nuvem" são da autoria de Raul Brandão, nome maior da literatura portuguesa, que por ali passou há 90 anos a bordo do São Miguel, numa viagem de Lisboa ao Corvo.
As notas dessa viagem estão publicadas em "As Ilhas Desconhecidas". Contam-nos que "todas as ilhas têm uma nuvem sua, uma nuvem própria, independente das outras nuvens e do céu, e com uma vida à parte no universo."

SANTA CRUZ
É aqui que aterra o avião que vem da Terceira ou de São Miguel. A Graciosa é a segunda mais pequena das nove ilhas que formam o arquipélago dos Açores e por isso, porque o tráfego talvez não justifique, não tem ligações diretas ao continente.
Santa Cruz com os seus monumentais reservatórios de água conta a história da secura nos magníficos jardins da praça principal desta vila recheada de casas senhoriais. A praça é tranquila. Assemelha-se a uma pequena vila alentejana no silêncio; quebrado pelo ruído do mar!
Em Santa Cruz, verdadeira capital administrativa da ilha, é obrigatório ver o Museu e a Igreja Matriz. Na verdade, vale a pena entrar em todas as igrejas e quem tiver boas pernas deve subir ao Monte de Ajuda.

A TERRA DOS MOINHOS E DAS QUEIJADAS
Existem em algumas outras ilhas dos Açores mas estes moinhos de cúpula vermelha são uma imagem da Graciosa. Lindos, cuidados, a lembrar o tempo passado em que tudo o que se comia tinha de ser produzido na ilha. Agora a história é outra e Vila da Praia, a terra onde acosta o barco que faz a ligação inter-ilhas, tem uma avenida de moinhos prontos para receberem pessoas (uns para visita, outros para alojamento). E tem também um café "O Ilhéu" onde se provam as magníficas queijadas da Graciosa e outras guloseimas produzidas na fábrica que fica numa rua mais recuada da mesma vila.
Nos tempos que correm as queijadas talvez sejam o produto mais exportado da Graciosa. Mas o ícone mais famoso será sempre o Ilhéu da Praia, defronte da vila, expoente máximo do título de Reserva da Biosfera da Unesco que a ilha (juntamente com o Corvo) conquistou em 2007. Este ilhéu é um paraíso para observadores de aves que terão de tentar contactar os responsáveis locais pelo ambiente ou as agências de viagem locais para lá chegar. Não é fácil, os graciosenses ainda não se aprimoraram na arte de organizar estes passeios para visitantes.

A CAMINHO DA FURNA DA MARIA ENCANTADA
A lenda da Maria Encantada é um bom pretexto para uma vista panorâmica na parte sul da ilha e para aguçar a vontade de conhecer uma lenda local. A furna desta mulher que terá sido das poucas sobreviventes de uma explosão vulcânica é acessível por uma estrada que contorna a parte superior da Caldeira. Quem entrar na furna e a atravessar encontra a deslumbrante imagem de um vulcão gigantesco (cratera com 4,4 km de diâmetro) completamente arborizado. Um cenário mágico para contemplar e desfrutar a caldeira vulcânica de maiores dimensões da Europa.
O plano de arborização foi feito em meados do século passado para contrariar a erosão e a secura. Até aí o interior da caldeira era inóspito. Nada a ver com o ambiente que quase transporta a imaginação do visitante para um bosque dos Alpes Suiço, inundado por espécies exóticas como a Camellia japonica ou a Cryptomeria japonica que tão bem se adaptaram aos Açores.
O interior da caldeira é acessível de carro pela base do vulcão. Atravessa-se o túnel e entra-se noutra dimensão.

A segunda maravilha deste parque natural é a furna do enxofre, uma cavidade em abóbada com 40 metros de altura. São precisas boas pernas e bons sapatos para lá chegar. O acesso é feito pelos 183 degraus de uma torre construída em 1939. No seu interior encontra-se um lago de água fria e uma fumarola com lama, responsável pela libertação de gases, recordando a sua origem vulcânica.
"O chão da Furna do Enxofre, parcialmente coberto por blocos caídos do teto, é inclinado para sudeste e termina num lago de água fria que ocupa a parte mais funda da estrutura", indica a informação do parque.

"As características peculiares da Furna do Enxofre tornam-na num dos pontos turísticos de maior interesse não só da ilha Graciosa, mas de todo o arquipélago dos Açores". Longe vão os tempos em que o príncipe Alberto do Mónaco (que visitou várias ilhas dos Açores no século XIX) foi obrigado a descer por cordas para conhecer a furna e "entrar na conduta principal, ou chaminé, de um vulcão activo" como se lê na informação do parque.

A BANHOS NO CARAPACHO
Há um veio da água sulfurosa da furna que quer caminhar para o mar e desemboca nas piscinas até há pouco naturais do Carapacho, hoje um pouco acimentadas pelo homem. Na Graciosa quase que não existem praias de areia e as piscinas completamente naturais ou um pouco artificializadas são a melhor maneira de ir a banhos.
No Carapacho há uma piscina onde a água do mar se mistura com a água que vem da furna; os locais acreditam nas propriedades terapêuticas da sua água tépida. Imediatamente atrás, num velho balneário termal restaurado, funcionam as termas/spa do Carapacho onde se pode descer aos aquíferos subterrâneos que outrora abasteciam as termas, obrigando um conjunto de trabalhadores a trabalho braçal para o transporte.
As termas do Carapacho funcionam todo o ano e são um local aprazível para hidromassagens e duches vichy. A cheirar a enxofre mas o enxofre cura maleitas de várias espécies.



Texto e imagens adaptado: http://expresso.sapo.pt/todas-as-ilhas-tem-a-sua-nuvem=f917381

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