Dia Mundial da Poesia
Foi a 16 de Novembro de 1999, na XXX Conferência Geral da UNESCO, que foi proclamado o Dia Mundial da Poesia a 21 de Março, com o objectivo de defesa da diversidade linguística e promover a leitura, escrita, publicações e ensino da poésia através do mundo.
Trago-vos um poema de um escritor Açoreano, mais própriamente da Ilha Terceira, Vitorino Nemésio, intitulado de "Já Velho e Doente", onde este fala em duas Ilhas Açoreanas (Terceira e São Miguel).
Já Velho e Doente
«Seja a terra da Terceira
A minha coberta de alma»,
Disse eu na idade fagueira,
Em que tudo é força e calma.
Mas hoje, já velho e doente,
Em que as almas não se cobrem,
Hoje sim, peço seriamente
Que os sinos por mim lá dobrem.
Até já me aconselharam
Um quarto lá no Hospital,
Tanto caipora me acharam,
Escaveirado, mal, mal...
Ali visitas teria
Por obra de misericórdia,
Embora comida fria,
Alguma vez, que mixórdia!
Mas sempre era doce ao peito
Ir acabar os meus dias
Na Praia, de qualquer jeito,
Perto da casa das tias.
Tive o exemplo resignado
Que me deu a prima Alzira
Num lençolinho lavado
Com rendas limpas na vira.
Ali matámos saudades,
Ela alegre e penteadinha,
Mal pensando eu que as idades
Não perdoam. Hoje é a minha.
Também cheguei a pensar
No Asilo, talvez com um biombo.
Sou biqueiro. Mas jantar?
Todos ali, lombo a lombo.
Como outrora o Tintaleis,
Três-Quinze, Manuel de Deus
Eram duas vezes seis,
Lava-Pés, e Pão-por-Deus.
Mas já sei que nem no hotel!
(A família não consente).
Tenho que amargar o fel
Mortal como toda a gente
Morrer num navio, à proa,
Numa aldeia ou num porão,
Provavelmente em Lisboa
Prò Alto de S. João.
Se acaso em Ponta Delgada
Me fosse dado ter fim:
Queria a última morada
Com Antero, em S. Joaquim.
O melhor é não pensar.
É seja onde Deus quiser.
Bem me podem sepultar
Ao pé de minha mulher.
Vitorino Nemésio, in "Caderno de Caligraphia e outros Poemas a Marga"
A minha coberta de alma»,
Disse eu na idade fagueira,
Em que tudo é força e calma.
Mas hoje, já velho e doente,
Em que as almas não se cobrem,
Hoje sim, peço seriamente
Que os sinos por mim lá dobrem.
Até já me aconselharam
Um quarto lá no Hospital,
Tanto caipora me acharam,
Escaveirado, mal, mal...
Ali visitas teria
Por obra de misericórdia,
Embora comida fria,
Alguma vez, que mixórdia!
Mas sempre era doce ao peito
Ir acabar os meus dias
Na Praia, de qualquer jeito,
Perto da casa das tias.
Tive o exemplo resignado
Que me deu a prima Alzira
Num lençolinho lavado
Com rendas limpas na vira.
Ali matámos saudades,
Ela alegre e penteadinha,
Mal pensando eu que as idades
Não perdoam. Hoje é a minha.
Também cheguei a pensar
No Asilo, talvez com um biombo.
Sou biqueiro. Mas jantar?
Todos ali, lombo a lombo.
Como outrora o Tintaleis,
Três-Quinze, Manuel de Deus
Eram duas vezes seis,
Lava-Pés, e Pão-por-Deus.
Mas já sei que nem no hotel!
(A família não consente).
Tenho que amargar o fel
Mortal como toda a gente
Morrer num navio, à proa,
Numa aldeia ou num porão,
Provavelmente em Lisboa
Prò Alto de S. João.
Se acaso em Ponta Delgada
Me fosse dado ter fim:
Queria a última morada
Com Antero, em S. Joaquim.
O melhor é não pensar.
É seja onde Deus quiser.
Bem me podem sepultar
Ao pé de minha mulher.
Vitorino Nemésio, in "Caderno de Caligraphia e outros Poemas a Marga"
http://galeriacores.blogspot.pt/2008/02/vitorino-nemsio-o-pai-da-aorianidade.html
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