Entrevista a Carlos Melo, conhecido por muitos como o endireita, figura emblemática da ilha do Pico.
Cátia Goulart: Olá bom dia.
Carlos Melo: Bom dia.
C.G: Senhor Carlos para começarmos a falar um pouco sobre a sua vida e percebermos o seu percurso, qual era a sua profissão?
C.M: Principiei por ser agricultor com os meus pais. Meu pai era agricultor criava era gado e tinha terras.
C.G: Gostava da vida da terra?
C.M: Gostava e ainda hoje mesmo sem puder, adoro sempre a terra. Também comecei a fazer pipas com meu pai, ele não era carpinteiro mas fazia pipas para usar vinho, canecas para usar leite, naquele tempo não havia latão e fazia selhas para a gente se lavar, pois não havia banheiras.
C.G: Há uns anos atrás estava ligado à Filarmónica, não era?
C.M: Eu ajudei a fundá-la em 1946.
C.G: E tocava música?
C.M: Principiei logo a tocar música desde o início e ajudei a fazer a casa da sede da Filarmónica.
C.G: E ensinou música?
C.M: Naquele tempo não tínhamos professor de música, tinha de ser com a prata da casa, eu e outros ensinámos, mas a bom dizer durante muitos anos que só eu é que ensinava.
C.G: Hoje em dia o que é que o Senhor Carlos faz para ocupar os seus tempos livres?
C.M: Nos meus tempos mais livres trabalho nas pessoas como endireita.
C.G: Realmente é assim que é conhecido por toda a gente…
C.M: Por todo o mundo, passa por aqui gente de todo o mundo, ainda ontem que até é engraçado, vieram-me aqui dois médicos de Guimarães.
C.G: Precisavam dos seus serviços?
C.M: Estavam na festa de Santa Maria Madalena e cramavam muito das costas a uma pessoa amiga e ela disse-lhes que sabia onde é que lhe iam tirar essas dores. Ele perguntou onde seria e quem e aí ela disse em Santo Amaro em fulano. Eu tinha ido ao Cais do Pico da parte da manhã em serviços meus com a minha filha e quando cheguei estava cá um deles e o outro tinha ido ao café, já estavam à minha espera.
C.G: E fora o seu ofício, de ajudar as pessoas, como endireita, o que é que o Senhor Carlos faz mais?
C.M: Eu às vezes ainda faço umas coisinhas de artesanato, agora já mais passageiras, pois as mãos já não estão seguras.
C.G: E que peças é que fazia?
C.M: Eu fazia de tudo que se usava antigamente a trabalhar no campo, fazia de tudo…
C.G: Em madeira?
C.M: Em madeira. Fazia ainda maquetas de botes da baleia e traineira. Ainda tenho muita coisa, tenho ali um museu e tenho quase tudo, é para ficar para a minha filha.
C.G: Quando é que descobriu esta vocação este dom que tem para endireita?
C.M: Olhe, éramos oito irmãos e os outros não se importavam com isto, pois a minha avó já o fazia. Chamava-se Maria Felícia por isso é que nós apanhámos o apelido dela. Comecei a vê-la fazer umas coisas e gostava, mas nunca pensei em trabalhar nisto. Mais tarde sucedeu-me num pé e ela já não podia, por já estar muito velhinha, e fui ao Sr. Furtado ao Faial, um homem que também diziam que nunca havia de morrer como dizem hoje de mim que trabalhava muito bem, arranjou-me o pé e vim para casa mas ele disse-me que depois de desmanchar uma vez ficamos sujeitos a voltar a acontecer, e que quando sucedesse me sentasse no chão e fizesse assim ao pé. Dei-me em rir e disse-lhe que da maneira que doía como é que podia fazer aquilo, até porque naquele tempo não se usava nada que hoje em dia uso como pomadas e produtos. A pessoa só sente se eu quiser, mas também prejudica-nos as anestesias fortes, só uso quando é mesmo necessário. Como estava dizendo, depois sucedeu-me novamente, voltei a desmanchar o pé no mato e até expliquei esse episódio no programa do Carlos Cruz que se chamava “Carlos Cruz à quarta-feira”.
C.G: Como foi a experiência de ir ao programa?
C.M: A televisão vinha cá muita vez e eu estava a trabalhar na oficina, entretanto chegaram umas pessoas e disse-lhes que esperassem um instantinho que ia ali. Tinha uma árvore aqui fora da porta, tenho até revistas aqui com isso, e vim para aqui para fugir deles para não verem, mas eles às escondidas filmaram. Depois vieram aqui chamar por mim uns rapazes que trabalham na Madalena na Rádio Televisão Portuguesa e tiveram aqui uma filmagem comigo. Depois o Carlos Cruz ligou para mim a convidar para ir a Lisboa ao programa dele com uma senhora das Flores e então lá é que disse que tinha aprendido nos animais e expliquei muitas coisas.
C.G: Estava a contar que tinha desmanchado o seu pé e que tinha ido ao Faial e então depois voltou a desmanchar!?
C.M: Voltei a desmanchar! Ia com o meu irmão mudar as vacas e o touro mas ele desmanou-se um bocadinho do gado e eu tive de dar uma carreira para aguentá-lo e fiquei com o pé novamente na mesma. Disse logo a meu irmão que já não passava dali, que ele fosse deitar o gado dentro sozinho, e trouxesse o leite que eu ia caminhando para chegar a casa ainda com o calor, mas primeiro peguei no pé e fiz o que homem tinha feito no Faial. Pareceu-me que fiz, e fiz mesmo! Estalou como ele tinha feito lá e principiei a dobrar bem o pé e a andar bem, doía-me muito mas cheguei a casa e minha mãe mandou-me sentar e fez papas de farinha de milho com água, vinagre e sal, que eram os remédios caseiros que se usavam naquele tempo, a partir daí é que comecei a fazer umas coisas, mas pouco. Lembro-me que um dia chegou-me um rapaz de África, no tempo da guerra, que fracturou uma perna e vieram me chamar para consertar e disse”O Quê? Eu não sei fazer nada dessas coisas!” mesmo nunca tinha feito, mas ele era muito delgadinho assim da canela e principiei a olhar e vi que se puxa-se aquilo assim para diante que aquilo ia endireitar, estava sobreposto. Naquele tempo não havia ligaduras, não havia nada, caminhei para casa de meu cunhado que vendia fazendas e pano de lençol, trabalhava com mercuriuzinhos, era tintura e álcool e então trouxe umas tiras de pano de lençol e vim para cima, onde fiz umas talhinhas de madeira no José Costa. Fui a casa do rapaz e consertei-lhe a canela e correu bem. Depois principiaram a dizer que eu sabia fazer aquilo. Não sabia nada!
C.G: Foi o seu primeiro cliente?
C.M: Foi o primeiro cliente fracturado, daí em diante principiaram a vir causa de uma mão, outros de um dedo, de um pé, mas eu ainda não sabia nada…
C.G: E que idade tinha nessa altura?
C.M: Nessa altura ainda tinha 25, 26 anos era muito novo, ainda estava solteiro… já lá vão muitos anos. Depois comecei na minha miúda já mais a sério, quando partiu o bracinho e deitou o cotovelo fora do sítio e então a partir daí é que foi já mais a sério. Uma vez a Lisboa com o artesanato, na feira do livro na Avenida da Liberdade, e comprei um livro de medicina que ensinava muitas coisas, e ensinou-me ainda muito, como a maneira de colocar as ligaduras, porque não havia gesso naquele tempo e falava também de fazer as caixinhas de madeira para se usar nos pés ou nos braços se partissem e não cair para banda nenhuma. Pois trouxe esse livro e a minha miúda naquele tempo gostava de ver e ler, ela também era jeitosa para trabalhar, trabalhou muitos anos comigo, mas hoje não tem vida para isso, e então quando viu o livro disse, este livro não trás nada de novo para o pai, estas caixinhas de madeira e estas coisas o pai já faz. Daí para a frente é que principiou tudo e tem sido uma coisa muito séria.
C.G: O senhor Carlos fez algum tipo de formação para saber fazer?
C.M: Fui aprendendo à minha custa como se costuma dizer, mas hoje tenho formação, mas digo sempre que não tenho. Se não tivesse não tinha revistas e não me deixavam ter as coisas que tenho na loja. Já fizeram queixa de mim, não foram os médicos, mas as pessoas que trabalham de massagista e de fisioterapia que querem trabalhar com as maquinetas e não vão onde os dedos vão, mas o meu médico é que descobriu isso e então agora toda a gente sabe que tenho formação, mas digo sempre que não tenho.
C.G: Que tipo de problemas aparecem aqui para tratar?
C.M: Aparecem aqui coisas muito más. Está uma parede aqui fora ainda com o ferro à mostra, onde não morreu ali um casal no dia da festa de Santa Maria Madalena porque foram os Santinhos que rezaram por eles, estava deitado, deito-me quase sempre à meia-noite e parecia-me que tinha ouvido gritar aí fora, ouvido uns estoiros. Levantei-me, vim à casa de banho e do lado de fora a gritavam e chamavam-me, fui à porta, mas nunca julguei que fosse gente da freguesia. Às vezes vinham-me chamar fora de horas, mas agora já depois de mais velho não me quero levantar nem o meu médico quer, de qualquer maneira o que eu queria dizer com isto que eles escaparam milagrosamente. Tinha o braço deslocado do lugar e duas costelas metidas para dentro, cavalgada uma na outra. Vieram para dentro e arranjei produtos para não doer, mas disse-lhe que era preciso tirar uma radiografia e no dia seguinte ela foi ao hospital. Apanhou uma pancada no peito, estava toda negra, já fui lá duas vezes massajá-la, foi ao hospital e estava tudo certinho nos seus lugares.
C.G: E aparecem também muitas outras coisas?
C.M: Todos os dias surgem pés, braços, mãos, dedos…
C.G: E qual foi a coisa mais difícil até hoje?
C.M: Já o Carlos Cruz me colocou essa pergunta. Um filho do João Duarte que já morreu e que era professor, ele era miudinho tinha 7 anos e tinha partido uma perninha por cima em três lugares e a perna não se aguentava ia para um lado e para o outro, veio com o José do Correio que tinha um carro de praça, começou a cramar a sua vida que não tinha dinheiro, naquele tempo o governo não ajudava, e eu disse-lhe que tinham de ir para o Garrete na Terceira, que não era para mim, porque a perninha estava partida em três lugares e era aqui por cima e podia ser preciso cortar-lha. Principiou a cramar que não podia e eu sempre a puxar para trás, estava com um homem nuns cerrados a quebrar espiga ao milho e a minha mulher sempre a dizer que não, e fui-me enchendo de coragem, naquele tempo eu era muito novo ainda e disse vou arranjar isso, mas vou a casa de vocês. Vim primeiro a casa, à oficina, tirei-lhe a medida à perninha, tive a fazer uma caixinha para depois deitar a perna dentro para o pé ficar direito ao ar. Liguei-lhe a perna lá em casa, de maneira que aquilo correu tudo bem e então desse tempo em diante principiei a ter uma fama medonha. Era tudo para aqui, e foi o serviço mais difícil que fiz naqueles tempos.
C.G: E o senhor Carlos faz ideia, já lá vão muitos anos de trabalho, de quantas pessoas lhe passaram pelas mãos?
C.M: Há 56 anos que trabalho nisto… já não são centos mas milhares, só um dia destes aqui para trás tive 22 pessoas, um cão, um gato e uma égua e hoje já estou com 13 e é o dia de menos de há muito tempo para cá. De inverno quando está menos pessoal de fora sempre escasseia mais uma coisinha mas de verão é sempre cheio.
C.G: Costuma marcar as pessoas para saber o numero de atendimentos?
C.M: O ano passado foi o que tive mais 22 pessoas do que os outros anos todos, mas este ano ainda estamos quase a meados do Verão e já tenho mais 14 pessoas do que o ano passado. Agora vou estar três semanas de férias, pois vou à América, não vou trabalhar e isso também vai prejudicar a estatística.
C.G: É mais difícil tratar dos animais?
C.M: Não trata-se muito bem, só tem uma coisa os animais às vezes... Eu corria essa lomba toda quando era mais novo, juntamente com os veterinários para saber se podiam ligar e consertar, para os animais viverem e ficarem bons, mas se eu via que já não se podia fazer nada o veterinário já não dava medicamentos nem injecções, mandavam logo abater. Fiz isso muitos anos, eu é que decidia. Ainda hoje vieram com um vitelo e disse-lhes que fossem para traz com ele e o abatessem, tinha caído de uma barreira e partiu a bacia, mas que fossem falar com o veterinário mas que não servia de nada, e foram para trás mas já foi para abatê-lo.
C.G: O senhor Carlos é uma pessoa muito conhecida no nosso meio, vem pessoas de outras ilhas, de outros lugares à sua procura?
C.M: Vem delas todas, de todos os lugares… Corvo, Flores, São Miguel, Santa Maria, pode dizer-se que vem de todo o mundo de propósito.
C.G: Tem noção da sua importância para a população?
C.M: Nunca se parece importante ou que se faça uma coisa boa que não haja outro que seja igual, agora nesta parte penso vai ser um bocadinho mais difícil, bate aqui gente de todo o mundo, trabalho já há 56 anos como disse, não é há uma semana. É muita prática, as pessoas chegam aqui e ás vezes sentam-se ali para eu ver um pé ou uma mão e não pergunto o que eles tem, já vou lá e aperto logo com o dedo, eles dão um salto e perguntam como é que o senhor sabia que era aqui, e digo lhes que é tudo nos mesmos lugares, a parte do corpo humano eu sei a toda de uma ponta à outra.
C.G: Mas como ganhou esse tacto?
C.M: Olhe vou dizer-lhe uma coisa, estudei muito nos animais, nos porcos, os antigos diziam que quem quisesse ver o nosso corpo era matar um porco, o organismo deles é muito semelhante ao nosso. Abati muitos porcos, desmanchava e fazia muitas experiencias, até cheguei a abrir a cabeça deles várias vezes para as escolas, para os alunos verem os nervos que vinham para os olhos, para verem tudo, cheguei a fazer experimentações de todas as maneiras.
C.G: Gatos, talvez fossem mais fáceis por causa dos ossos?
C.M: O gato é muito diferente do nosso corpo, tinha aqui uma gatinha com uns certos anos, muito manca, mas os gatos são agressivos mesmo que sejam mancos, no principio quis-me morder e foi preciso ser presa e meter-lhe a cabeça dentro de uma saca, depois desmontava-lhe as patinhas, deitava-a no chão e ficava sem puder andar, depois voltava outra vez a puxar e ela levantava-se, já por fim não era preciso fazer nada disso, pegava-lhe e fazia aquilo que queria com ela, deitava-a no chão quietinha, levantava-se e caminhava outra vez, mas um que não tenhamos feito isso... Vem ai tantos para consertar mas é preciso trazer outra pessoa e aguentar bem pelo pescoço e segurá-los pois são agressivos e não respeitam os donos nem quem está a trabalhar neles.
C.G: O Senhor Carlos se desmanchar, conserta a si próprio?
C.M: Aqui há tempos pisei-me na rótula num joelho e fiquei com a rótula torcida. Até aqui tenho resolvido e vou resolvendo aos outros mas esta agora não sei como vai ser, estava ali a passar uns panos para ajudar a empregada e pensei que estava ainda com vinte anos e fui mudar o pé para trás e faltou-me o pé no degrau e vi que me ia pisar bem pisado, enviei comigo para o lugar mais largo e fiquei com a rótula do joelho torcida, a empregada viu aquilo e ficou muito agoniada, calhou que vinha chegando meu sobrinho que vem passar férias aqui e ajudou. Vim para dentro e consertei, foi a última coisa que fiz agora ultimamente em mim.
C.G: Como estava a dizer são muitos anos de prática. Não tem aparecido ninguém que quisesse aprender?
C.M: Já apareceram vários, mas isto não se aprende assim, se fosse de um momento para o outro não havia um médico que não soubesse trabalhar nisto, mas foi como disseram uns que estiveram aqui… que não estudam estas coisas, isto é um coisa que já nasce, já vem de natureza, é um dom que a gente trás.
C.G: Tendo em conta que é muito procurado desde há muitas décadas, nunca teve nenhuma proposta para trabalhar num hospital ou clube desportivo?
C.M: Em clubes tive muitos, mas a minha vida não deu. Antes queria estar em casa, dava mais certo, trabalhava para mim e atendia o pessoal. Fui massagista do Fayal Sport uns anos, naquele tempo andava no cinema em volta dessa ilha mais meu cunhado Amaro, cinema ambulante, depois ia para o Faial todos os fins de semana para ir aos treinos, andei também ligado ao futebol aqui de Santo Amaro durante 20 anos, fui Presidente da Junta, da bola, da Filarmónica, tive isso tudo em cima de mim, minha mulher dizia que tinha um negócio grande, mas era das algibeiras para fora.
C.G: E nunca houve nenhum clube maior interessado naquilo que faz?
C.M: Vou dizer sem nenhum susto, nem medo nenhum, tive 5 meses em Lisboa e aprendi muito a ir aos treinos do Benfica, tinha o padre Neves que já morreu e tinha o Morais que era costureiro, que eram sócios do Benfica. Naquele tempo não ligava ao futebol, comecei a ir lá e a gostar de ver aquilo, depois também principiei a ajudar, são todos massajados antes de trabalharem, eles tem massagistas mas não sabem consertar, nem de entorses, só mesmo para massajar e preparar o corpo para eles puderem correr, de resto não sabem consertar. Às vezes vejo coisas na televisão que eles apanham e digo paciência isso era uma coisa que amanhava-se num instante. Do Benfica tive uma proposta grande, podia ter ficado por lá, não fiquei e nunca me arrependi, talvez podia ter feito vida de outra maneira, talvez trabalhando menos, mas não tinha ajudado tanta gente como ajudei até aqui, por isso gosto de trabalhar nisto, por isso é que trabalho ainda com a idade que tenho.
C.G: Alguma vez teve algum reconhecimento por esta actividade que presta à população?
C.M: Fizeram-me uma homenagem muito grande, tenho ali fora uma montra cheia de ofertas das Filarmónicas, Grupos da Bola, medalhas, salvas de prata, diplomas, uma coisa grande que tenho ali…, o Governo é que me fez essa homenagem. Às vezes quero dizer uma coisa e não me lembro vocês hão-de desculpar porque a idade já é muita, já são 83 anos e também tive um AVC, fiquei a andar numa cadeira de rodas e já fui operado 3 vezes. Isto ainda é um milagre estar assim… principiei depois a fazer uns regos para fazer fisioterapia com mais facilidade, para dispor uns pés de cebolinho e às vezes o alvião prendia e caía adiante porque não tinha força para isso, mas a vontade estava!
C.G: Senhor Carlos, para terminar alguém que tenha uma entorse, um ombro fora do sítio como pode vir até si e procurar os seus serviços?
C.M: Pois todos já sabem, é só perguntar, mesmo aqueles que vão acima do Pico e se pisam já os guias chamam para aqui, nem sequer procuram os centros de saúde. Ainda o verão passado foi interessante com uns casais de Italianos, uma senhora pisou-se muito num cotovelo, um outro senhor caiu e deitou uma rótula do joelho virada ao alto. Tinha ido ao Cais nesse dia à tarde, geralmente é depois da hora de trabalho que se junta muita gente aqui, tem dias que está tudo cheio, e vi-os chegar aqui a senhora estava com um braço ligado e fui direito a ela, amanho primeiro os que estão mais pisados, perguntei-lhe o que tinha, falava italiano, mas a gente percebe e perguntou-me se não fazia uns barquinhos para vender? E eu disse que fazia, e que tinha, mas não era para venda, mas mesmo assim pediu-me para lhe mostrar, disse que sim mas que esperassem e sentei-os. Agora o que estava com a rotula virada ao alto estava ali fora num jipe e as lágrimas corriam-lhe pela cara abaixo, tinha muitas dores, depois arranjei a outra senhora na loja, parece muito difícil mas logo que não tem nada facturado amanha-se num instante, deitei uma mão aqui adiante e outra ali e puxei para diante, aquilo foi logo ao seu lugar, mas depois tive de massajar e dar um bocadinho de produto para não doer. A senhora esteve um bocadinho parada e então dizia em italiano parece impossível, parece impossível... deu em fazer movimentos com o braço e perguntei-lhe se estava tudo bem ao que me respondeu que sim. Então agora vamos buscar o outro senhor, deitei-o em cima do mesão onde trabalho, dei uma anestesia mais forte, deitei-lhe a mão ao pé atrás e vi que não havia fracturas, nem nada, dou-lhe aquele jeito e deu um estalo, ele caiu certinho no seu lugar, principiei a massajar e a explicar-lhe no esqueleto, que tenho pendurado, que o que tinha apanhado no joelho era entre o minúsculo e a rótula, e ele disse que não precisava explicar porque fazia aquilo só que de faca. Afinal eram quatro médicos e só disseram no fim, tiveram primeiro no centro de Saúde da Madalena e os médicos que estavam disseram logo que eles fossem para fora, para o Faial, nem sequer lhe tocaram e então veio um enfermeiro à porta ou uma rapariga que trabalhava lá e disse-lhe que em vez de irem para o Faial que viessem aqui e perguntaram-lhe se era médico dos ossos e ela disse-lhes que sim e eu arranjei tudo e ficaram bons.
Bem haja!
Cátia Goulart
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