O Castelo de São Sebastião de Angra do Heroísmo


A pirataria aparece nos mares dos Açores logo nas primeiras décadas do século XVI, mas só pelos anos cinquenta surgiu fundado receio de que as acções de pilhagem pudessem atingir o próprio porto de A.H., na ilha Terceira, então escala obrigatória nas viagens de retorno das Índias.
Simultaneamente com o artilhamento do Castelo de São Cristóvão, manifestamente inofensivo na perspectiva defensiva da baía, foi efectuado um plano defensivo da ilha. Peça fundamental desse plano, foi o Castelo de São Sebastião, vulgo Castelinho, cuja construção se terá iniciado em 1572. Torna-se o Castelo de São Sebastião, não apenas um reforço substancial do sistema defensivo anterior, mas no garante efectivo da segurança do porto oceânico de escala obrigatória das rotas marítimas intercontinentais. Graça a ele, a cidade pôde desenvolver-se e prosperar. Defesa tão eficaz que afasta a esquadra de D. Pedro de Valdez, em 1581, levando-o ao infeliz desembarque na Salga.
No ano de 1583 se iniciam obras de melhoramento no Castelo de São Sebastião, com especial destaque para algumas instalações para homens e materiais, e para o reforço da frente voltada a terra onde a muralha era baixa e desprovida de qualquer sistema protector. Com efeito, a construção do Castelo de São Filipe do Monte Brasil nasce, essencialmente, da incapacidade física do Castelinho, desde o início vocacionado para a defesa marítima, de albergar e proteger os homens e os armamentos que o rei de Espanha queria colocar estrategicamente a meio entre Europa e as Américas. Mas a defesa específica do porto de Angra, essa continuava confiada á F.S.S.
Em 1767, João Júdice, na revista que fez a todos os fortes da ilha, regista alguma ruína na F.S.S. É o reflexo do abandono a que a defesa militar dos Açores fora votada há muitas décadas. Como naquela data regista, a artilharia que lá existia era exactamente a mesma e apenas a que os espanhóis deixaram em 1641. A guarnição da F.S.S. era, dada pelo Castelo de São João Baptista, sob o comando de um capitão. Isto é, continuava a ter guarnição permanente. E o cargo de Capitão do Castelo era disputado, movendo influências na corte. Por este tempo o Castelo de São Sebastião terá sido objecto dos necessários melhoramentos, tal como parte da restante fortificação da ilha.
No final do séc., a partir de 1797, é grande o temor de que os Açores possam ser atacados pelas tropas francesas. Numa situação de penúria extrema de armas e munições, o armamento do Castelo de São Sebastião sempre esteve nas preocupações dos responsáveis pela defesa da ilha. Ele continuava imprescindível para a defesa da cidade. Como imprescindível se mantinha em 1822, a crer na planta do sistema defensivo da baía de Angra.
Quando em 1885 alastrou em Espanha uma epidemia de cholera morbus e se receou, que ela invadisse Portugal e pudesse chegar aos Açores, o Governo Civil do Distrito de Angra do Heroísmo pediu ao Ministério do Reino que obtivesse do Ministério da Guerra autorização para construir, na F.S.S., um lazareto, a fim de ali serem tratados, vigiados e saneados todos os indivíduos que chegassem à ilha, vindos de portos suspeitos de tal epidemia. Não havendo razões que contrariassem esta pretensão, face ao clima de segurança militar que então se vivia no Arquipélago, foi ela satisfeita, e instalado o lazareto no terrapleno baixo, com trânsito directo para o Porto das Pipas por uma pequena porta aberta a muralha.
Um relatório de 1887 regista o mau estado de conservação da fortaleza, propondo o seu encascamento e a reposição de pedras em falta nas raízes das muralhas.
Nos primeiros anos do séc. passado, a Junta Geral do Distrito de A. H., encomendou um projecto (1902) e deu início à construção (1904) de um posto de Desinfecção Terrestre e Marítimo no Castelo de São Sebastião.
Para além do Castelo de São Sebastião ter sido uma presença constante e interveniente em de quatro séculos de vida de Angra do Heroísmo, importante é, também, no plano arquitectónico, pela sua tipologia. É com a construção do Castelo de São Sebastião que Angra é dotada de uma moderna fortificação, à altura das necessidades defensivas de uma cidade que passara a estar na confluência das grandes rotas marítimas intercontinentais.
No Castelo de São Sebastião as muralhas perderam a altura do castelo medieval e ganham a robustez necessária para contrair o poder destrutivo da artilharia; as torres dão lugar a dois baluartes virados a terra, desenvolvendo-se duas ordens de baterias para o lado do mar. O interior é espaçoso, nele se erguendo até inícios do século passado, praticamente apenas a casa do Governador e a cisterna; ficando os alojamentos para o ajudante e a guarnição adossados aos baluartes; os próprios paios abriam-se sob o terrapleno dos baluartes. Com objectivos exclusivamente estratégicos, quanto menos edifícios comportasse, menor seria, logicamente, a destruição, em caso de ataque. Para além de ter sido concebido para ser guarnecido por ordenanças, gente do povo, com suas casas e família na cidade, que apenas ali permanecia o tempo necessário para prestar serviço. Um exemplar de excepção, pela tipologia e pelas ressonâncias históricas e sociais, do primeiro abaluartado nacional e da fortificação defensiva destas ilhas.
Obras empreendidas pelos Monumentos Nacionais em meados dos anos noventa, foram criadas as condições que permitiam o alojamento da Marinha nos edifícios tradicionais do forte, e a remoção das construções recentes, sem qualidade estética, e perturbadores da harmonia arquitectónica e funcional do sistema defensivo. Pela mão do Governo da Região Autónoma dos Açores e da Câmara Municipal de Angra do Heroísmo, no interior é construída uma Pousada de Portugal, ficando do sistema defensivo do mais antigo edifício da cidade património mundial, referência monumental estruturante no processo da usa inclusão na lista de classificação da UNESCO, apenas as muralhas e os modestos alojamentos castrenses, transformados em mais-valia ornamental do empreendimento turístico.  
Imagem das Muralhas do "Castelinho" já com as infraestruturas da Pousada

Fonte Fotografia: Associação Regional de Turismo
Texto: Sebastião Medeiros

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