Descemos
ao centro da Terra para mergulhar no interior de um vulcão, entre uma chaminé
de vegetação luxuriante e grutas de rochas multicolores. Bem-vindos ao Algar do
Carvão, ex-líbris da ilha.
Chove copiosamente lá fora e também aqui, dentro do centro do centro da Terceira, as pingas caem incessantes. Estamos no Algar do Carvão, principal ex-líbris turístico da ilha, uma das cavidades vulcânicas mais impressionantes do arquipélago. “É o único sítio do mundo onde conseguem ver o interior de um vulcão assim com estas características”, garante Mário Rosa, da delegação regional de turismo e nosso guia na Terceira. “Há outro parecido na Indonésia mas não é visitável.”
Visto de fora, no entanto, o Pico do Carvão passa despercebido entre os cerros vizinhos. Nada faz suspeitar que debaixo do verde e frondoso manto que se ergue à nossa frente se esconde um cone vulcânico perfeito, daqueles que nos povoam a imaginação desde que brincávamos com plasticinas. Para lá chegar, percorremos um túnel com paredes de betão, tão comprido e estreito que quase não lhe vislumbramos o fim. O tecto do corpo a centímetros do tecto do corredor. O ar, de repente húmido e gélido, arrepia os ossos, faz-nos subir o fecho dos casacos. Já nos sentimos dentro da Terra. Toupeiras a caminho de casa. Um corredor que nos aperta o espírito para deixá-lo a navegar de assombro quando se abre a sala do vulcão à nossa frente.
Quando entramos no interior da chaminé ficamos-lhe sensivelmente a meio: para cima, um cone de rochas multicolores e luxuriante vegetação vai-se fechando sobre as nossas cabeças, terminando num círculo aberto ao céu; para baixo, uma escadaria desce num ziguezague íngreme até duas câmaras vulcânicas. Está frio dentro da Terra, dentro do vulcão. E chove quase tanto como na rua. Pingas grossas que caem do tecto oco e das paredes permeáveis para ressoarem suaves à nossa volta. Vem de fora o bater ritmado do coração da Terceira.
Só mais tarde lhe veremos a respiração, as narinas fumegantes das Furnas do Enxofre a confirmar que, apesar de adormecida, ainda existe actividade vulcânica na ilha. Não têm a exuberância das furnas de São Miguel, mas ganham no enquadramento na paisagem natural. Um cenário quase esotérico, com fumarolas mergulhadas entre vegetação fofa e rochas lamacentas, que vão perdendo a cor, apagada pela composição química do enxofre.
Mas, para já, ainda estamos no avesso da Terra, na base do cone e primeiro “miradouro” do algar, onde um guia introduz os visitantes na história desta estrutura vulcânica. Terá sido formada em duas fases, a primeira há três mil anos, durante a grande erupção do “Pico Alto”, no aparelho vulcânico de Guilherme Moniz, já existente, e que derramou as suas lavas até grandes distâncias, formando sectores de rocha traquítica. Mais tarde, uma nova erupção, agora basáltica, rasgou o solo e a lava saiu, voltando depois a escorrer para dentro da cratera, quando a erupção parou abruptamente. Nas paredes, aponta, ainda conseguimos ver vestígios desta escoada, assim como zonas com grandes formas arredondadas, criadas pelas bolsas de gás que se formaram no interior e que explodiram nesta altura.
O primeiro relato de uma descida ao interior da garganta vulcânica data de 26 de Janeiro de 1893, com recurso a cordas, mas só em 1963 se iniciavam descidas organizadas, então já realizadas pelo grupo de jovens terceirenses que nesse ano fundaria Os Montanheiros, organização não governamental que gere turisticamente o Algar do Carvão e a Gruta do Natal (um túnel lávico com 700 metros de comprimento, localizado a cerca de seis quilómetros de distância, que não teremos tempo de visitar).
Chove copiosamente lá fora e também aqui, dentro do centro do centro da Terceira, as pingas caem incessantes. Estamos no Algar do Carvão, principal ex-líbris turístico da ilha, uma das cavidades vulcânicas mais impressionantes do arquipélago. “É o único sítio do mundo onde conseguem ver o interior de um vulcão assim com estas características”, garante Mário Rosa, da delegação regional de turismo e nosso guia na Terceira. “Há outro parecido na Indonésia mas não é visitável.”
Visto de fora, no entanto, o Pico do Carvão passa despercebido entre os cerros vizinhos. Nada faz suspeitar que debaixo do verde e frondoso manto que se ergue à nossa frente se esconde um cone vulcânico perfeito, daqueles que nos povoam a imaginação desde que brincávamos com plasticinas. Para lá chegar, percorremos um túnel com paredes de betão, tão comprido e estreito que quase não lhe vislumbramos o fim. O tecto do corpo a centímetros do tecto do corredor. O ar, de repente húmido e gélido, arrepia os ossos, faz-nos subir o fecho dos casacos. Já nos sentimos dentro da Terra. Toupeiras a caminho de casa. Um corredor que nos aperta o espírito para deixá-lo a navegar de assombro quando se abre a sala do vulcão à nossa frente.
Quando entramos no interior da chaminé ficamos-lhe sensivelmente a meio: para cima, um cone de rochas multicolores e luxuriante vegetação vai-se fechando sobre as nossas cabeças, terminando num círculo aberto ao céu; para baixo, uma escadaria desce num ziguezague íngreme até duas câmaras vulcânicas. Está frio dentro da Terra, dentro do vulcão. E chove quase tanto como na rua. Pingas grossas que caem do tecto oco e das paredes permeáveis para ressoarem suaves à nossa volta. Vem de fora o bater ritmado do coração da Terceira.
Só mais tarde lhe veremos a respiração, as narinas fumegantes das Furnas do Enxofre a confirmar que, apesar de adormecida, ainda existe actividade vulcânica na ilha. Não têm a exuberância das furnas de São Miguel, mas ganham no enquadramento na paisagem natural. Um cenário quase esotérico, com fumarolas mergulhadas entre vegetação fofa e rochas lamacentas, que vão perdendo a cor, apagada pela composição química do enxofre.
Mas, para já, ainda estamos no avesso da Terra, na base do cone e primeiro “miradouro” do algar, onde um guia introduz os visitantes na história desta estrutura vulcânica. Terá sido formada em duas fases, a primeira há três mil anos, durante a grande erupção do “Pico Alto”, no aparelho vulcânico de Guilherme Moniz, já existente, e que derramou as suas lavas até grandes distâncias, formando sectores de rocha traquítica. Mais tarde, uma nova erupção, agora basáltica, rasgou o solo e a lava saiu, voltando depois a escorrer para dentro da cratera, quando a erupção parou abruptamente. Nas paredes, aponta, ainda conseguimos ver vestígios desta escoada, assim como zonas com grandes formas arredondadas, criadas pelas bolsas de gás que se formaram no interior e que explodiram nesta altura.
O primeiro relato de uma descida ao interior da garganta vulcânica data de 26 de Janeiro de 1893, com recurso a cordas, mas só em 1963 se iniciavam descidas organizadas, então já realizadas pelo grupo de jovens terceirenses que nesse ano fundaria Os Montanheiros, organização não governamental que gere turisticamente o Algar do Carvão e a Gruta do Natal (um túnel lávico com 700 metros de comprimento, localizado a cerca de seis quilómetros de distância, que não teremos tempo de visitar).
Em 1968 era inaugurado o
primeiro túnel, entretanto alargado e consolidado a betão. E em 1973 era
terminada a escadaria inicial de acesso aos diferentes patamares da cavidade,
da chaminé vertical às duas câmaras que se abrem na base, vai enumerando o jovem
guia. Desde 2006 que, no âmbito das celebrações do aniversário da associação, é
realizada uma prova de resistência pela escadaria acima. Miúdos e graúdos numa
subida em contra-relógio pelos mais de 300 degraus em pedra escorregadia, desde
a superfície da lagoa interior à entrada do centro de visitantes.
Não nos tentamos a experimentar tal façanha. Preferimos ficar debruçados sobre o lago de águas pluviais que cobre o fundo da cavidade. Cerca de 80 metros de altura distanciam o topo da cratera do chão da lagoa. É nesta ala que ainda se encontram algumas estalactites e estalagmites de sílica amorfa, mas muitas destas formações de cor leitosa já desapareceram, arrancadas por visitantes. “Uns levavam como recordação, outros pensavam que poderia ter algum valor económico”, conta Mário Rosa. O mesmo terá acontecido com a maioria das pedras de obsidiana, rocha vulcânica de negro cristalino, considerada rara e semipreciosa.
O complexo do Algar do Carvão termina na “catedral”, uma sala de tecto abobadado com ares de gruta de presépio em tamanho real. Das colunas de som instaladas junto às paredes sai música clássica, testemunha da boa acústica do espaço, ocasionalmente utilizado para concertos e celebração de eucaristias. Antes de continuarmos o passeio até às furnas, Mário aponta para um buraco num recanto do tecto da sala. Daqui não se vê o fim da cavidade e, durante anos, especulou-se ser a entrada para outras câmaras vulcânicas. Quando finalmente conseguiram subir lá cima descobriram que o túnel terminava pouco depois; para sempre apelidado de “boca dos enganos”.
Sentimo-nos engolidos pelo vulcão, mais perto dos mundos imaginários do que da realidade que segue lá fora. Estaríamos prontos a continuar em Viagem ao centro da Terra, tal como sonhou Júlio Verne em 1864. Na obra do escritor francês, a aventura começa com a descida pelo interior de um vulcão na Islândia (onde existe uma afamada câmara magmática visitável próximo da capital) mas bem que podia ser aqui, imaginamos. Alex e o tio emergiram num vulcão na Sicília. E nós, onde iríamos terminar?
Não nos tentamos a experimentar tal façanha. Preferimos ficar debruçados sobre o lago de águas pluviais que cobre o fundo da cavidade. Cerca de 80 metros de altura distanciam o topo da cratera do chão da lagoa. É nesta ala que ainda se encontram algumas estalactites e estalagmites de sílica amorfa, mas muitas destas formações de cor leitosa já desapareceram, arrancadas por visitantes. “Uns levavam como recordação, outros pensavam que poderia ter algum valor económico”, conta Mário Rosa. O mesmo terá acontecido com a maioria das pedras de obsidiana, rocha vulcânica de negro cristalino, considerada rara e semipreciosa.
O complexo do Algar do Carvão termina na “catedral”, uma sala de tecto abobadado com ares de gruta de presépio em tamanho real. Das colunas de som instaladas junto às paredes sai música clássica, testemunha da boa acústica do espaço, ocasionalmente utilizado para concertos e celebração de eucaristias. Antes de continuarmos o passeio até às furnas, Mário aponta para um buraco num recanto do tecto da sala. Daqui não se vê o fim da cavidade e, durante anos, especulou-se ser a entrada para outras câmaras vulcânicas. Quando finalmente conseguiram subir lá cima descobriram que o túnel terminava pouco depois; para sempre apelidado de “boca dos enganos”.
Sentimo-nos engolidos pelo vulcão, mais perto dos mundos imaginários do que da realidade que segue lá fora. Estaríamos prontos a continuar em Viagem ao centro da Terra, tal como sonhou Júlio Verne em 1864. Na obra do escritor francês, a aventura começa com a descida pelo interior de um vulcão na Islândia (onde existe uma afamada câmara magmática visitável próximo da capital) mas bem que podia ser aqui, imaginamos. Alex e o tio emergiram num vulcão na Sicília. E nós, onde iríamos terminar?
Fonte: in publico.pt / http://www.iloveazores.net
Ana Cabrita
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