Desde meados do
séc. XIX, que vários cientistas internacionais e nacionais se têm debruçado
sobre o estudo científico das jazidas de fósseis de Santa Maria,
reconhecendo-as como um “santuário” único no Atlântico Norte e promovendo o seu
maior conhecimento. Temos tido o privilégio de participar nalgumas dessas
expedições, ficando mais por dentro e conhecedores deste valioso tesouro de
Santa Maria e dos Açores, devendo o mesmo marcar uma singularidade da atracção
turística da nossa ilha.
Há mais de duas
décadas, que vimos relevando a riqueza geológica de Santa Maria, defendendo a
sua divulgação e rentabilização dentro das áreas doecoturismo e turismo
científico, assim como a sua devida classificação e firme
protecção.
A ilha de Santa
Maria, oferece sobejas potencialidades neste tipo de turismo, uma vez que
patenteia, endogenamente, um valioso património cultural e natural,
apresentando, este último, deslumbrantes paisagens e notável biodiversidade de
flora, avifauna, artrópodes e moluscos terrestres, e sobretudo uma singular
geodiversidade, com formações geológicas e geomorfológicas únicas nos Açores,
exponenciada com a sua enorme e singular riqueza paleontológica, que são os
fósseis marinhos, com milhões de anos, já de reconhecimento supra-nacional.
Santa
Maria é ilha mais ”velha” dos Açores, remontando as lavas mais antigas a uma
idade superior a 10 milhões de anos (Madeira, 1986).
Dentro do arquipélago,
Santa Maria, é a única ilha que possui rochedos calcários, por sedimentação da
era Terciária (65 a 8 milhões de anos), onde se encontram inseridas
conchas de moluscos e ossos de espécies há muito extintas, conhecidos
popularmente como “ossos de gigante”.
No que
toca a formações vulcânicas e basálticas, destacam-se as escoadas lávicas
submarinas, em almofada (“pilow lavas “), únicas nos Açores, perfis de cones de
escórias, alterações lávicas de grande valor cénico (Barreiro da Faneca),
interessantes filões, curiosos tufos e várias disjunções prismáticas e
esferoidais, de rara beleza.
As jazidas de
fósseis marinhos e de formações sedimentares e basálticas de interesse
encontram-se um pouco por toda a ilha, com destaque para a Cré, Ponta das
Salinas, Ponta do Castelo, “Pedra-que-Pica” (Baixa do Sul), Lagoínhas, Ponta
Negra (S.Lourenço) e a zona classificada do Figueiral-Praínha, que inclui o
Monumento Natural Regional da Pedreira do Campo.
Na aceitação das
contribuições que demos para a classificação de zonas como a Cré, Barreiro da
Faneca, e Costa Norte, englobando as costas das Lagoínhas e Tagarete, assim
como a faixa costeira do Figueiral-Praínha, foi fundamental contarmos com a
sensibilidade do Senhor Director Regional Eduardo Carqueijeiro, e o facto das
propostas apresentarem como substrato argumentativo, alguns estudos científicos
a que recorremos.
A
referência às jazidas fósseis de Santa Maria vem já desde o século XVI (e.g.,
Gaspar Frutuoso em “As Saudades da Terra”), com a extracção de calcários
utilizados na construção e coloração de caiação de habitações (cal e lajes de
pedra calcária). No entanto só, desde há 150 anos para cá, foram alvo de
estudos científicos, merecendo o vivo interesse de cientistas de diversas
paragens, já tendo originado várias descobertas, estudos, publicações e até
teses de mestrado e de doutoramento, como comprovam, as pesquisas que efectuei,
apresentadas abaixo, numa breve resenha histórica.
A
maioria dos autores que trabalharam os depósitos fossilíferos de Santa Maria,
dedicaram maior atenção às jazidas do Miocénico. Neste grupo pioneiro estão
Bronn (1860, in Hartung, 1860), Reiss (1862), Mayer (1864), Cotter
(1888-1892), Friedlander (1929), Berthois (1950, 1951, 1953), Ferreira (1952,
1955), Krejci-Graff et al. (1958), Zbyszewski et al. (1961), Zbyszewski &
Ferreira (1961, 1962) e Mitchell-Thomé (1976).
Na década
de 80, a investigação diminuiu tendo praticamente estagnado.
Já em 1990, foram publicados dois
trabalhos relacionados com os fósseis Quaternários de Santa Maria
(García-Talavera, 1990; Callapez & Soares, 2000).
As jazidas
fósseis Plistocénicas de Santa Maria foram intensivamente estudadas por Sérgio
Ávila, desde 1999, tendo feito parte integrante da sua tese de doutoramento
(Ávila, 2005). Deste trabalho, que envolveu a deslocação a Santa Maria por 11
vezes (1 em 1999, 4 em 2000, 3 em 2001, 2 em 2002 e 1 durante o ano de 2005)
resultou a publicação do estudo sistemático dos moluscos marinhos fósseis
(Ávila et al., 2002).
O resultado mais
visível deste esforço de investigação, foi o aumento do número de espécies de
moluscos marinhos reportadas para o Plistocénico de Santa Maria que, em pouco
mais de um século, passou de 9 (Mayer, 1864) para 101 (Ávila et al.).
Os estudos de
Amen (2002) e Amen et al. (2005) também vieram acrescentar um mais adequado
conhecimento da paleoecologia da jazida da Prainha, em particular, do seu
estrato de algas fósseis, também existentes na Praia do Castelo (Praia
Formosa).
Como se pode
ver, neste reinício do estudo sistemático da riqueza fossilífera de Santa
Maria, pós 1998, o Doutor Sérgio Ávila, deu (e continua a dar) contribuição de
vulto, tendo proporcionado, na sequência desse trabalho, várias expedições
internacionais, caracterizadas essencialmente pelo seu carácter científico, bem
como pela divulgação à população local, por parte dos participantes através de
interessantes palestras.
Dessas
expedições, igualmente resultaram vários artigos científicos (e.g., Cachão et
al., 2003) e uma colecção de referência (DBUA-F), actualmente a mais completa
sobre as jazidas fossilíferas de Santa Maria.
A expedição de
Junho de 2009, a sexta da série ‘Paleontologia nas Ilhas Atlânticas’,
permitiu encontrar uma nova espécie de invertebrados, dois novos registos de
tubarões e outros dois de moluscos marinhos, descobertas que, segundo nos disse
Sérgio Ávila, serão divulgadas em artigos científicos, enobrecendo ainda mais o
tesouro dos fósseis de Santa Maria.
Fonte: Wikipédia
Silvia Vieira